SARAU BANQUETE EXPERIMENTAL: SABERES E SABORES
Tata-se de conferir aos espaços civis ou não-governamentais de comércio, geralmente associados à noção restrita e equivocada do privado ou particular, um estatuto de formação e criação humana e cidadã no campo da cultura e das culturas.
Em se tratando de espaços como os das livrarias essa tese se torna ainda mais pertinente, já que os limites entre o público e o privado, o comércio material e o simbólico se tornam mais tênues ou quase inexistentes. Não obstante, diante da atuação moderna atualmente destacada do Estado Nacional e de Direito na formação cultural de um povo é necessário refletir que o comércio como mecanismo social, político e econômico de troca de bens materiais consiste em ser historicamente, há muito tempo, um dos motores mais importantes das transformações e criações no campo da cultura, muito anterior ao próprio Estado cujo status consistente gozado no presente é um resultado recente da civilização.
Tanto na Antiguidade quanto na Idade Média ocidentais as primeiras instituições educativas e formadoras foram as famílias, sendo que essas, em alguns momentos, abriam suas portas e braços para receber crianças e jovens de outras origens para serem educados junto aos seus. Em outras palavras, demorou muito tempo para formas governamentais como o Estado assumir a educação das pessoas.
O exemplo historiográfico mais emblemático desse caráter formador dos espaços civis muito antes da consolidação dos Estados Nacionais e do Capitalismo são as chamadas Corporações de Comerciantes e de Artesãos, notavelmente marcantes na segunda metade do tempo da chamada Idade Média. Inicialmente restritas aos membros da família, aos poucos elas foram se abrindo segundo uma noção de irmandade e de um certo profissionalismo, até mesmo chegando a amparar seus confrades em tempos difíceis de comércio.
Tais corporações, além do caráter protecionista das respectivas categoriais ocupacionais ou profissionais, foram se tornando locais de referência tanto concernente à formação técnica quanto à formação moral de pessoas, registrando-se forte caráter de fraternidade e cooperação, principalmente em relação aos seus próprios membros, sendo aos poucos destinadas ao controle relativo ou absoluto, em especial contra estrangeiros, de setores manufatureiros, industriais ou de comércio. Com relação ao surgimento e crescimento da literatura romanesca e filosófica não eclesiástica é evidente o protagonismo civil individual ou corporativo para além dos braços da Igreja e dos Estados em formação.
Tomando tais considerações como uma demarcação historiográfica, epistemológica e política sintética, um pequeno grupo de pessoas preocupado em construir espaços alternativos – não-governamentais – de formação e criação cultural, tanto para além das malhas do Estado, quanto suprindo um lacuna não preenchida pelo poder público local, iniciou um processo de constituição de um coletivo de caráter espontâneo e livre em torno de uma proposta prática de encontros cuja finalidade principal é refletir sobre os contextos culturais globais e locais a partir de temáticas específicas a serem abordados no formato metodológico de compartilhamento e troca de alimentos e conhecimento.
Assim, o formato dos encontros passou a obedecer a dinâmica de banquetes, resgatando tanto os princípios contidos no Banquete, de Platão; bem como na Santa Ceia cristã. A partir disso, lançamos como slogan dos eventos a noção de um Banquete onde e quando as pessoas poderiam compartilhar, trocar e experimentar sabores e saberes.
Na forma de título lemos o seguinte enunciado: Banquete Experimental: saberes e sabores. Resgatamos, por sua vez, a íntima relação etimológica entre as palavras “saber” e “sabor”, de tal modo que a segunda deriva da primeira. Passamos a compreender, a partir dessa relação, que todo sabor implica um saber, isto é, um ato de conhecer um gosto, configurando, portanto, um saber acerca dos gostos dos alimentos. Mais ainda, a questão do sabor se estendeu para as dinâmicas das descobertas às voltas do desconhecido.
Em termos práticos e metodológicos, as pessoas passaram a ser convidadas para participarem do evento com a condição de levarem até ele um sabor e um saber. O sabor consiste em ser um alimento, um prato ou uma bebida típicos ou exóticos. Quanto ao saber, caberia aos participantes oferecerem seus conhecimentos na forma de filosofia, ciência, poesia, literatura, pintura, fotografia, cinema, música etc.
Para cada encontro contamos ainda com convidado especial responsável por instigar os presentes a adentrarem em um clima social de compartilhamento, troca e experimentação de sabores e saberes. A exposição dos convidados têm como pretensão apenas aguçar e provocar a fome e os conhecimentos dos participantes, o implicava uma fala breve e pontual em relação a algum tema proposto, encerrando propositalmente com inúmeras lacunas e muitas perguntas e dúvidas, como sendo um mecanismo de estimular os presentes a elaborarem respostas a partir de suas reflexões.
Professor Dr. Renato Izidoro da UFAM, colaborador do Projeto Jovem Leitor.
NOSSO CONVIDADO PARA DIALÓGAR SOBRE O SENTIDO DO SARAU SABERES E SABORES E COMO SURGIU NA LIVRARIA UNIVERSITÁRIA DE PARINTINS-LUPA
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